O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) manifestou preocupação com a possibilidade de ser preso por “atos antidemocráticos” durante uma reunião ministerial ocorrida em 5 de julho de 2022, meses antes da eleição em que não conseguiu a reeleição.
A fala está no contexto do conteúdo que integra o conjunto de provas apresentadas pela Polícia Federal para conseguir as ordens judiciais usadas na operação Tempus Veritatus, deflagrada na quinta-feira (8) e que apura suposto plano de tentativa de golpe de Estado.
“Eu tenho que me virar acreditando que vai dar tudo certo ano que vem? Eu vou descer daqui da rampa preso por atos antidemocráticos”, afirmou o ex-presidente.
A gravação é de uma reunião da alta cúpula do governo, no Palácio do Planalto. Com as imagens no inquérito, os agentes conseguiram os mandados de busca, apreensão, medidas cautelares e prisão usados na operação que teve o ex-presidente, generais e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, entre os alvos.
Operação Tempus Veritatis
A Polícia Federal (PF) deflagrou na manhã de quinta-feira (8) uma operação que visou buscar provas em investigação que apontam para uma “tentativa de golpe de Estado” em 2022, que estava sendo organizada por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O plano impediria a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e manteria o ex-presidente no poder, de acordo com a instituição.
Para conseguir os 33 mandados de busca e apreensão, as 48 medidas cautelares que podem incluem apreensão de passaporte e/ou proibição de manter contato com os demais investigados, além das quatro ordens de prisão, a PF apresentou à Procuradoria-Geral da República (PGR) um relatório. O documento tem análises de investigadores, com material anexado e apresentado como prova.
O conteúdo inclui mensagens de textos e áudios, além de vídeos dos investigados. Na representação, a PF disse haver indícios de tentativa de que uma “organização criminosa” visava golpe de Estado e planejou a abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
Para a suposta trama criminosa, a PF apontou seis núcleos que disseminavam “a narrativa de ocorrência de fraude nas eleições presidenciais, antes mesmo da realização do pleito, de modo a viabilizar e, eventualmente, legitimar uma intervenção das Forças Armadas, com abolição violenta do Estado Democrático de Direito, em dinâmica de verdadeira milícia digital”.
O que diz a PF sobre o vídeo e a suposta ‘organização criminosa’
Para conseguir os mandados de busca e apreensão, além das ordens de prisão, para a operação de quinta-feira, a PF apresentou à Procuradoria-Geral da República (PGR) um relatório. O documento tem análises de investigadores, com material anexado e apresentado como prova. O conteúdo inclui mensagens de textos e áudios, além de vídeos dos investigados.
A representação da PF disse haver indícios de tentativa de que uma “organização criminosa” visava golpe de Estado e planejou a abolição violenta do Estado Democrático de Direito.
A tentativa de golpe de Estado é considerada crime, com pena que varia de 4 a 12 anos de prisão , além da punição correspondente à violência empregada para a busca de tomada do poder – ou permanência no poder, caso a intenção seja beneficiar quem está nele.
á a tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito ocorre quando alguém atua com violência ou grave ameaça para impedir ou restringir o exercício dos poderes constitucionais, como o STF. A punição vai de 4 a 8 anos de prisão, além da pena relativa à violência usada.
Para a suposta trama criminosa, a PF apontou seis núcleos que disseminavam “a narrativa de ocorrência de fraude nas eleições presidenciais, antes mesmo da realização do pleito, de modo a viabilizar e, eventualmente, legitimar uma intervenção das Forças Armadas, com abolição violenta do Estado Democrático de Direito, em dinâmica de verdadeira milícia digital”.
- 1. Núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral
Forma de atuação: produção, divulgação e amplificação de notícias falsas quanto a lisura das eleições presidenciais de 2022 com a finalidade de estimular seguidores a permanecerem na frente de quartéis e instalações, das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para o golpe de Estado.
- 2. Núcleo responsável por incitar militares à aderirem ao golpe de Estado
Forma de atuação: eleição de alvos para amplificação de ataques pessoais contra militares em posição de comando que resistiam às investidas golpistas. Os ataques eram realizados a partir da difusão em múltiplos canais e através de influenciadores em posição de autoridade perante a “audiência” militar.
- 3. Núcleo jurídico
Forma de atuação: assessoramento e elaboração de minutas de decretos com fundamentação jurídica e doutrinária que atendessem aos interesses golpistas do grupo investigado.
- 4. Núcleo operacional de apoio às ações golpistas
Forma de atuação: a partir da coordenação e interlocução com o então ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro, Mauro Cid, atuavam em reuniões de planejamento e execução de medidas no sentido de manter as manifestações em frente aos quartéis militares, incluindo a mobilização, logística e financiamento de militares das forças especiais em Brasília.
- 5. Núcleo de inteligência paralela
Forma de atuação: coleta de dados e informações que pudessem auxiliar a tomada de decisões do então presidente na consumação do golpe de Estado. Monitoramento do itinerário, deslocamento e localização do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e de possíveis outras autoridades da República com objetivo de captura e detenção quando da assinatura do decreto de golpe de Estado.
- 6. Núcleo de oficiais de alta patente com influência e apoio a outros núcleos
Forma de atuação: utilizando-se da alta patente militar que detinham, agiram para influenciar e incitar apoio aos demais núcleos de atuação por meio do endosso de ações e medidas a serem adotadas para consumação do Golpe de Estado.
PGR respaldou relatório da PF contra Bolsonaro e ministros
Todas as alegações da PF foram referendadas pela PGR, que enviou um parecer ao ministro Alexandre de Moraes, do STF. Ele decretou 33 mandados de busca e apreensão, quatro mandados de prisão preventiva e 48 medidas cautelares diversas da prisão. Entre elas, estão a proibição de manter contato com os demais investigados, suspensão do exercício de funções públicas e proibição de deixar o País.
Estes são os principais argumentos apresentados pela PF:
- Bolsonaro efetivamente participou e não apenas ouviu falar sobre um plano de tentativa de golpe. Ele sabia de uma minuta de decreto com medidas para impedir a posse de Lula e mantê-lo no poder. O então presidente da República discutiu o teor da chamada “minuta do golpe” e pediu ajustes.
- A versão inicial previa a prisão dos ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, do STF, além do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, mas Bolsonaro pediu que os nomes de Pacheco e Gilmar fossem retirados, mas exigiu a manutenção do trecho que previa a realização de novas eleições.
- Com as mudanças no texto original da minuta, Bolsonaro convocou generais e comandantes das Forças Armadas. Ele apresentou a minuta e pressionou os oficiais para aderir ao golpe. Apenas o comandante da Marinha colocou a tropa à disposição, segundo a PF.
- Militares da ativa pressionaram colegas contrários ao golpe para tentar convencê-los a aderir ao movimento. Em uma das conversas recuperadas pela PF, o general Braga Netto, então ministro da Defesa, chamou o comandante do Exército, general Freire Gomes, de “cagão”.
- Oficiais do Exército organizaram manifestações contra o resultado das eleições e atuaram para garantir que os manifestantes tivessem segurança. O movimento incluiu o acampamento em frente aos quartéis, onde, de acordo com a PF, militares ensinaram táticas de guerrilhas a civis.
- O grupo mais próximo de Bolsonaro, incluindo ministros civis e militares, monitorou os passos de Alexandre de Moraes, tocando informações sobre a agenda do ministro do STF. Esse núcleo da “organização criminosa” era comandado pelo ex-assessor especial de Bolsonaro Marcelo Câmara.
- A intenção do monitoramento era garantir a prisão de Moraes, caso o golpe militar fosse concluído. Segundo as investigações, Marcelo Câmara tinha o “itinerário exato de deslocamento do ministro” nas semanas finais de dezembro de 2022.
- Em dezembro de 2022, o então chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército, general Estevam Cals Theóphilo Gaspar de Oliveira, se reuniu com Bolsonaro no Palácio da Alvorada e disse que colocaria as tropas especiais nas ruas se ele publicasse a minuta do golpe.
- Os mais fiéis aliados de Bolsonaro, como Mauro Cid, seu ajudante de ordens, ajudaram a articular e financiar os atos que levaram à invasão e depredação das sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro. Mensagens recuperadas pela PF mostram Cid dando orientações e oferecendo R$ 100 mil a uma major do Exército para ajudar na organização dos atos em Brasília.
- O PL, partido de Bolsonaro, foi usado para financiar narrativas que atacavam as urnas eletrônicas. O partido contratou um instituto para elaborar um estudo questionando o resultado da eleição. Na sede da legenda, os policiais encontraram um documento para decretação do estado de sítio.
Da Redação Na Rua News